"...
Como que vindo comprovar a velha noção de que a guerra é uma fatalidade dos destinos humanos, constante, inevitável, substitui-se já à luta sangrenta pelas armas a chamada luta pacífica pelo trabalho. Ouvide como a moral contemporânea aplaude esta luta, como outrora a moral aplaudiu a luta religiosa: -"Cessa a carnificina iníqua pelo canhão e pelo sabre; a guerra de hoje é a guerra incruenta da inteligência, do esforço industrial, da competência produtora!..."- De acordo; mas é guerra também, infelizmente; estejamos certos de que surgirá uma época que a condene; e, no entretanto, vou eu rabiscando para aqui o que o assunto me sugere. Os soldados glorificados da guerra do trabalho não usam uniformes, vestem a camisola de operário; as armas não são canhões, são as máquinas, os engenhos; os regimentos são os sindicatos, os trusts; os marechais são os milionários da América e da Europa; as fortalezas são as enormes oficinas, as Bolsas e os Bancos; as esquadras manobram por todos esses mares, sem peças mas com os porões cheios de carga; o campo de batalha é o mundo inteiro. Resultados?... Não estala o ruído do canhão, nem turva o horizonte a fumarada dos explosivos, nem caem os cadáveres varados pelas balas; mas outros meios de devastação são empregados, rebentam também crises medonhas, como esta que há pouco amedrontou e ainda amedronta o mundo inteiro, o que quer que seja de depreciação da prata, provocado, diz-se, pelos trusts americanos; e morre de fome muita gente e caem milhares e milhares de famílias na miséria, e as listas dos suicídios acusam acréscimos tremendos... Então a guerra do trabalho é cruenta, como é a guerra pelas armas; guardemos esta noção no pensamento, embora não nos revoltemos contra a fatalidade dos destinos, que querem que todos os homens se disputem, cuidem de prejudicar-se entre si e vão ganhando uns à custa de outros. ..."
in Cartas do Japão, volume I, 2ª série, 1907-1908
quinta-feira, 11 de março de 2010
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Que extraordinária actualidade a desta reflexão!
ResponderEliminarObrigada por nos trazê-la à memória !
Vou divulgá-la e mais a este blog que pode ser de facto um optimo meio de manter viva a memória deste ser espantoso que foi Wenceslau de Moraes.
Cristina C